“Estou morrendo de tédio”, disse Maria (testemunha que prefere permanecer anônima). Maria, 27 anos, é graduada em direito com especialização em direito empresarial e trabalha como consultora legal em uma grande empresa do setor financeiro. “As perguntas que eu respondo e os processos que eu conduzo não mudam nunca. Me sinto quase como um robô. Não tenho nenhuma perspectiva de evolução, estou completamente desmotivada”, explica a jovem. Como resultado, Maria ficou depressiva. Ela sofre de tédio no trabalho. E ela não é a única a sentir isso. Tanto é que deram um nome para essa “síndrome”: boreout. O termo significa estar exausto por conta da falta de trabalho, motivação ou desafios profissionais. Por impactar os colaboradores, impacta, por consequência, o funcionamento dos negócios.
Além do boreout e de seu primo-irmão, o burnout, fala-se agora de brownout, baseado no “paradoxo da estupidez” desenvolvido por André Spicer: as empresas recrutam pessoas altamente graduadas e competentes para nunca pedir seu potencial máximo (senso crítico e capacidade de realização). Não estamos falando aqui apenas da geração dos millenials ou da geração Z, essa realidade está aplicada a muitos de nós.
De forma generalizada, a motivação e a satisfação no trabalho estão em queda. De acordo com a pesquisa conduzida pelo Instituto Locomotiva em 2017, apenas um terço dos trabalhadores formais brasileiros declarou-se satisfeito de forma geral com seu trabalho.
Corporate Hacking: Transformando o cotidiano das empresas
A boa notícia é que neste contexto, o movimento em torno do “Corporate Hacking” que está se espalhando no mundo nos parece bastante promissor e merece a atenção especial de executivos e líderes empresariais. Ele devolve o poder para os colaboradores realizarem mudanças internas - considerando um quadro estratégico, o propósito da marca e o que eles entendem como chave para a empresa -, de uma forma positiva e fazendo, de cada um, um “intra-empreendedor” em potencial.
Corporate Hacking é o movimento de pessoas pró-ativas, seguras de suas competências e que não esperam autorização para tomar decisões em prol de um bem comum e das empresas em que trabalham. Inspiradas por startups e negócios de impacto, elas estão dispostas a “hackear” o status quo por meio de respostas operacionais, concretas e de bom senso, criando soluções originais e gerando, de forma bem-sucedida, as transformações necessárias nas corporações. Essas pessoas conversam com a ideia de “desobediência bem-intencionada” como uma forma de corrigir falhas.
Como o Corporate Hacking conversa com a sustentabilidade
Por ser uma forma de transformar a cultura de uma empresa e iniciar a geração de mudanças, o Corporate Hacking é particularmente bem adaptado para apoiar as estratégias de sustentabilidade ou de negócios com propósito social forte. Afinal, não existe matéria prima melhor para incentivar os colaboradores a “hackear o sistema” do que os grandes desafios que enfrentamos como civilização e que impactam diretamente as operações das empresas. Nesse sentido, o Corporate Hacking nutrido com elementos da sustentabilidade incrementa o desenho da governança da empresa, pois ele auxilia o fomento de multiplicadores que, por consequência, colaboram na inserção dos desafios de sustentabilidade no cotidiano de diferentes áreas organizacionais.
Alguns exemplos da aplicação do Corporate Hacking nas empresas:
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Criação de uma semana anual do “license to hack”, para que os colaboradores possam contribuir com melhorias em processos internos e nos diferentes produtos. A “licença para hackear” deve estar alinhada à estratégia da empresa, propondo o foco em temas relevantes. Por exemplo: criação de uma semana para auxiliar a inserir tecnologias como Blockchain nas operações das empresas, solucionando questões críticas, como análise de sinistro, rastreabilidade da cadeia, etc.
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Implantação de um “Shadow Comex”, um comitê executivo "inspirador" que, geralmente, não tem poder de decisão, mas deve "inspirar" o comitê executivo oficial, sensibilizando-o ou orientando-o em um campo considerado estratégico à empresa. Este "Shadow Comex" pode assim ser constituído, por exemplo, por clientes de uma empresa que pretenda acentuar ou manter a sua "centralidade no cliente" ou por jovens para integrar tendências relacionadas, em particular, com a ambiência digital.
Na REVER e na UTOPIES, temos desenvolvido projetos pilotos em empresas que buscam a criação de um ambiente inovador e que se alimenta de soluções para a resolução dos principais desafios da sociedade. Os projetos utilizam desde Sprints de Inovação (construídos ao redor de ferramentas como Canvas, Design Thinking, Pitch, Storm Board e Minimum Viable Product), até o desenho e a articulação de prêmios e campanhas. Esses projetos buscam acelerar a implantação das estratégias organizacionais e, ao mesmo tempo, olhar para os problemas reais da nossa época, dentro e fora da empresa, buscando solucioná-los e maximizar os impactos positivos.